quarta-feira, setembro 08, 2010

Sempre o pão

Uma herança bem antiga, esta do pão. Tão antiga que morre nas profundezas do nascimento da civilidades nas práticas alimentares.

É também o pão que fará a destrinça entre os homens civilizados e os homens bárbaros. É também o pão que revela o homem transformador, o homem do saber fazer. O saber fazer que, para além do pão, também chega ao azeite e ao vinho, trempe fundamental da nossa civilização mediterrânica.

Os romanos como povo difusor da cultura da alimentação, tinham no pão um emblema forte da sua dieta. No entanto, aquando da sua chegada a terras lusitanas, já por cá existia o pão fermentado em detrimento do pão ázimo. Talvez por via desta simbiose, conquistador conquistado, nos costumes alimentares, se tenham demorado por cá tanto tempo.
Ainda hoje somos guardadores zelosos desta epopeia do pão. Do pão, símbolo dos anseios do povo nas palavras de políticos e poetas. Pão e circo; a paz, o pão, a saúde, a habitação… Do pão, mote das sentenças populares:

pão, pão, queijo, queijo; a pão e laranjas; comer o pão que o diabo amassou. Do moreno pão de trigo que em tempos também foi de centeio, como tempos antes o tinha sido de outras sementes.

E tal como a nossa cultura não dispensa o azeite e o vinho, não prescinde igualmente do pão nosso de cada dia. O pão, cujo oscilar de preço nos continua a provocar o barómetro interior do nosso descontentamento mais elementar. O pão, o único produto a que o Salazar nunca permitiu subir o preço - coisas da sensibilidade primária de qualquer ditador que o quer continuar a ser.

Disse-nos recentemente a comunicação social que a cotação do trigo bateu o recorde, o que inevitavelmente terá consequências acrescidas para uma panóplia de bens alimentares essenciais. O aumento do consumo de carne nos países em desenvolvimento, principalmente na China e na Índia, está na origem da subida dos preços. O sustentar das necessidades básicas dos homens, tem um impacto tal no andar do mundo que, talvez, o abane mais que o crescente e desmesurado aumento do preço do petróleo. É a supremacia da necessidade de satisfazer o óbvio em detrimento do supérfluo.
Mau augúrio este indicador transmitido pelas bolsas de valores. Um mundo que contende pela posse de produtos básicos, é certamente um mundo à beira de convulsões imprevisíveis. No entender de que esse imprevisível é onde assenta hoje o omnipresente mercado global. Mercado que, não esqueçamos, é composto por uma imensidão de seres humanos capazes de pontapear a harmonia reinante a qualquer momento e em qualquer direcção. É dos livros!

Do Joaquim Pulga

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