quinta-feira, fevereiro 24, 2011

A Caprinicultura e a nossa Floresta

A importância da silvo-pastorícia nas zonas Florestais foi destacada por diversos oradores, no âmbito de alguns painéis do seminário denominado "multi-funcionalidade da Floresta através da Exploração dos Recursos Florestais e Silvopastoris", que decorreu no Centro de Operações e Técnicas Florestais (COTF), na Lousã, em Abril passado. Com um programa centrado em questões como o aproveitamento da Biomassa Florestal Residual; as estratégias de Redução do Risco de Incêndio Florestal e papel da Silvopastorícia nas Zonas Florestais os diversos oradores tiveram entre a assistência simultaneamente muitos agentes económicos ligados à área florestal e criadores de caprinos. Este seminário organizado no âmbito de uma vasta parceria entre a Direcção Regional de Agricultura e Pescas do centro, a Direcção Geral de Recursos Florestais, a Federação dos Produtores Florestais de Portugal, a Escola Superior Agrária de Coimbra e o Instituto de Desenvolvimento Agrário da Região Centro contribuiu assim para uma afirmação clara da importância da caprinicultura extensiva e dos caprinicultores em meio florestal. Embora falte o principal, que é partir do conhecimento técnico que tem vindo a ser produzido, para uma mais clara acção no terreno - de qualquer modo, é positivo, que finalmente as mentalidades comecem a mudar (com estudos técnicos a demonstrarem aquilo que empiricamente todos podíamos perceber mas não provar). Embora já existam algumas explorações pioneiras de caprinos em explorações florestais a verdade é que só agora se começa a dar o devido valor ao papel das cabras como "sapador florestal" de baixo custo, ainda por cima com a virtude potencial de reciclar desperdícios florestais causadores de riscos de incêndio em produtos úteis como carne e leite... Infelizmente durante décadas (desde os anos 30/40 do século XX) predominou a visão, injusta, da cabra como inimiga da floresta, dado poder danificar algumas árvores juvenis, ou até, em caso de pastoreio intensivo em pouco espaço, algumas espécies de árvores adultas. Viu-se o detalhe e tentaram afastar-se as cabras e os pastores da floresta... De facto as cabras podem danificar algumas árvores e alguns pastores precisavam do mesmo espaço que outros entendidos queriam para florestar. Foram proibidas as cabras nas florestas, e as queimadas em espaço florestal (ou adjacente) para evitar incêndios. Alguns pastores, carvoeiros e agricultores de cereais de montanha (especialmente para produção de centeio em encostas com forte declive)precisavam de as fazer... Pelo que ou abandonaram essas actividades ou passaram a faze-las à margem da lei e com riscos bem maiores. É um acto de justiça que em pleno século XXI a verdade seja reposta e se reconheça que a cabra e o pastor podem de facto ser auxiliares na Defesa da Floresta contra os incêndios, tal como de resto é praticado e reconhecido em diversos outros países mediterrânicos. Manter faixas extensas sem vegetação é tarefa cara e dificil quando feita apenas com meios mecânicos, além de ser um tremendo desperdício de espaço produtivo. Ora promover aí o pastoreio regular é não só estimular a humanização da paisagem e aproveitamento do território, como manter a biomassa controlada de forma barata e permanente. Esperemos então que neste virar de página histórico as Zonas de Intervenção Florestal passem a prever e a estimular a existência de rebanhos dentro do seu perímetro, acertando com os pastores as zonas de pastoreio estratégico. Que não se percam mais jovens que se querem instalar como criadores de caprinos e viver no espaço rural, contrariando a desertificação, só porque ninguém encontra um baldio ou espaço utilizável onde possam exercer a sua actividade económica... O que infelizmente vem acontecendo nas últimas décadas sempre que um jovem quer ser criador de caprinos, mas não tem terras ou posses económicas para as adquirir. Tanto espaço entregue a fogos e ao abandono e nenhuma solução para superar burocracias contraditórias. Fica a esperança que esta nova abordagem faça escola e que sejam os próprios responsáveis particulares ou públicos pela floresta a estimular o aparecimento de criadores de caprinos. Será também preciso que o Estado colabore a nível da legislação, pois para se instalarem os caprinos onde mais são necessários não se pode impedir a construção de capris só por a paisagem ter qualquer classificação especial... pois as cabras são justamente um possível defensor dessa paisagem. Obrigue-se a construções não permanentes - tudo bem! Mas, ajude-se quem pode ajudar a ser útil nesse aproveitamento do espaço florestal, pois cada jovem que a posse da propriedade e a burocracia detém é mais alguém que sem possibilidade de actividade económica terá de partir para a cidade... até que um dia, independentemente de todas as boas teorias, se torne impossível preservar as paisagens, por falta de pessoas que nelas trabalhem e as humanizem. Do Michael Gonçalves de Arganil a Santiago

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