sexta-feira, julho 20, 2012

Opinião – Foi há 55 anos

Polybio Serra e Silva - um homem de Friumes


Polybio Serra e Silva

Faço parte dum Curso Médico que acaba de festejar o seu 55º aniversário de formatura, uma vez que frequentou, a Faculdade de Medicina de Coimbra, nos anos de 1951 a 1957.

O nosso Curso foi o primeiro, e julgo que o único, a ter aulas duma nova disciplina, que não vingou e se chamava ”Parto sem dor”, onde aprendemos algumas noções tendentes a educar a grávida no sentido de dar à luz sem o sofrimento de que um parto, habitualmente, se reveste.

Tivemos, também, o privilégio de voltar a levar à cena a, então “falecida”, porque já há uma década não era realizada,” Récita dos Quintanistas”. Estabelecendo um entrosamento entre parto de “parir” e parto de “partir” e sem dor com, “a sorrir”, resolvemos chamar à nossa récita “Parto a Sorrir”, batizando com este nome o Curso que, há 5 anos, comemorou as suas Bodas de Ouro.

Da série de atitudes pioneiras que tomámos, quero hoje, e agora, recordar, simplesmente, uma que merece ser relembrada, no ano dedicado ao envelhecimento ativo, e se integra, perfeitamente, no espírito das Lojas de Saber.

Acontece que o nosso Curso foi o último a ter a sorte de ainda assistir às eloquentes aulas da eminente figura que foi o Prof. Bissaya-Barreto que se jubilou, exatamente, em 1956 e que, por razões de ordem política, não teve oportunidade de proferir a simbólica e tão almejada ”Última Lição”, habitualmente ouvida não só pelos pares como pelos amigos do palestrante, tendo sido mais tarde, em 1974, após o 25 de Abril, exonerado de todos os cargos oficiais que ainda possuía e intimado a abandonar o gabinete que mantinha, nos HUC, vindo a falecer, em Lisboa, em setembro de 1974.

Hoje, ao recordar esses conturbados tempos, fico pasmado, sem saber como foi possível terem atuado assim sobre este Homem a quem chamaram o “homem do futuro” pois, não temos a menor dúvida de que, tal como também já alguém escreveu, “o Prof. Bissaya-Barreto era um homem de ação como o demonstra a espantosa obra que legou, mas era também um intelectual de inteligência rara e grande sensibilidade, sempre a pensar em novos empreendimentos que pudessem ajudar os mais desfavorecidos”.

Após este desabafo, voltemos a pegar no fio da meada.

Da “enorme obra” desse “Grande Homem” destaco, simplesmente, um tudo-nada do que se relaciona com o lema da Fundação Bissaya-Barreto: “façamos felizes as crianças da nossa terra”, ou seja, a Casa da Mãe, na Figueira da Foz, 26 Casas da Criança, o Portugal dos Pequenitos e mais duas outras grandes obras que tive oportunidade de, com ele, também visitar, ou seja, o Rovisco Pais, uma meritória leprosaria e o Centro Hospitalar dos Covões.

Como já referi, o Mestre não deu a sua “Última Lição” e jubilou-se, exatamente, no ano em que me licenciei, sendo costume, no final de cada ano, o Professor oferecer, aos seus alunos, um passeio pela sua Obra, mais virada para a Medicina. Em face do acontecido, o nosso “Parto a Sorrir” sentiu-se prejudicado com a falta de tão educativa visita.

Então, substituindo o Delegado de Curso, impossibilitado de o fazer, abordei o Prof. Bissaya-Barreto no sentido de ele nos proporcionar essa ronda, pelo seu mundo, que poderia ser, para nós, considerada como a sua “Última Lição”.

Concordância imediata, marcação de data e, no dia aprazado, lá nos encontrámos na Casa da Mãe, na Figueira da Foz onde, simbolicamente, eu disse que o Bedel já anunciara estar na hora da “aula” e alinhavei algumas palavras que não devem ter sido muito más pois, no final, o nosso anfitrião mostrou-se admirado por alguém, numa altura em que já não se cultivava a oratória, ter falado como eu falei. Fiquei naturalmente envaidecido mas, logicamente, também com a incumbência de continuar a “aula” até ao fim. E assim foi.